A convite da Imagem Filmes e da MUBI assistimos antecipadamente ao terror psicológico “A Substância”, aclamado no Festival de Cannes e vencedor de melhor roteiro, que chega aos cinemas brasileiros no dia 19 de setembro. Vem saber o que achamos!
O enredo
Acompanhamos Elisabeth Sparkle, uma celebridade que ficou conhecida por um programa matinal de aeróbica, que descobre que vai ser demitida por não ser mais o tipo de mulher que as pessoas querem ver na TV, já que está em torno dos 50 anos. Saindo da empresa ela acaba sofrendo um acidente de carro e vai para o hospital, durante os exames um jovem médico aborda Elisabeth e a entrega um objeto com um número de telefone, logo ela descobre uma substância que promete transformá-la em uma versão mais jovem.
O roteiro
Essa é uma das poucas vezes que o trailer não mostra nem metade do que esperar de um filme. É uma daquelas produções que faltam palavras na hora de descrever qual é a experiência que você vai ter no cinema, mas prometo que vou tentar e sem dar spoilers.
O enredo parece simples, mas a forma como o roteiro aprofunda o tema é digno de Oscar, posso dizer que com certeza teremos um filme de terror psicológico voltando ao Oscar depois de Jordan Peele ter conseguido esse milagre há pouco tempo.
Logo no início você sabe que não vai ser um filme qualquer, ele já começa cheio de “semiótica”, pra quem não sabe o que é semiótica, é o estudo de significados, todas as cenas têm elementos que ou reforçam o enredo ou reforçam a crítica que esse filme faz a nossa sociedade obcecada pela beleza e pela juventude, o que é brilhante e um prato cheio para os cinéfilos.
Nas primeiras cenas acompanhamos a angústia vivida por Elisabeth, que não tem mais o corpo jovem que lhe deu a fama, ela então recebe a proposta de uma substância que ao usá-la vai transformar seu corpo em jovem, assim como ela era aos 20 anos, mas é claro que seu uso tem algumas regras e é exatamente a quebra dessas regras que torna o filme completamente único e bizarro. Uma dessas regras é a de passar 7 dias com seu corpo antigo e 7 dias com seu corpo jovem, mas quem é que quer ser velha depois de experimentar um corpo jovem? Estamos dispostos a fazer tudo em nome da beleza?
O foco do enredo é sempre “vocês são uma só” e o grande problema levantado é: sua mente madura não vai entender o que sua mente jovem está fazendo, seu eu do passado não é mais quem você é agora e vice e versa. Percebem que fazemos isso o tempo todo? Julgamos atitudes nossas do passado, sem levarmos em conta que naquela época não tínhamos a mesma maturidade de hoje, o filme então aborda esse tema de uma forma completamente Black Mirror.
Ao longo dele acompanhamos as quebras de regras que levam a substância a punir o corpo que está ativo, enquanto vemos o corpo jovem e maduro nunca chegarem a um acordo, mas não é de um jeito sexta-feira muito louca, fiquem tranquilos.
O filme é um horror, terror, eu gosto de chamar de terror psicológico, até porque ele não dá medo, sustos, ele dá um choque de realidade sem volta. Quem tem fobia de agulha, aqui fica o alerta, tive que fechar os olhos várias vezes enquanto as cenas de agulhas entrando apareciam, e não eram poucas. O estilo gore está muito presente, mas não é um gore gratuito, o sangue pelo sangue, a violência pela violência, o gore está presente para apoiar o choque de realidade que o filme se propõe a dar, e faz isso de forma impecável, a maquiagem e os efeitos especiais são extremamente reais, a impressão é de que estão cortando e costurando pessoas reais.
Lembra da semiótica? Pois então! Há tantas cenas que eu gostaria de comentar, mas eu não gostaria que alguém tivesse me contado antes de ver o filme, então não farei isso aqui, mas saiba que há muitas referências a filmes clássicos, a trilha sonora é a que dá mais apoio aqui.
Inicialmente eu não tinha gostado dos minutos finais do filme, mas depois de alguns dias refletindo sobre ele, cheguei a conclusão que ele também é perfeito, pois é nesse momento que a crítica se torna cômica e a tensão dá lugar a risada no cinema, como fazer isso em um terror psicológico? Talvez o mais perto que chegamos disso foi no filme Nope, de Jordan Peele, mas ainda está muito distante do que a diretora Coralie Fargeat alcançou.
O elenco
A produção marca o retorno de Demi Moore ao cinema, depois de uma temporada fora das telas por conta da gravidez. A atriz não poderia ter um retorno melhor! O maior erro do filme é nos fazer acreditar que Demi Moore é feia, com seus 61 anos a atriz está deslumbrante (você vai poder conferir ela nua diversas vezes, então sei do que estou falando). Escolher uma atriz icônica, que já tenha sofrido o efeito do tempo em sua aparência e não fez nenhuma grande cirurgia estética para mudar isso com certeza foi um dos grandes desafios da produção. Demi Moore entrega emoção, sensibilidade e empatia em doses perfeitas, já Margaret Qualley interpreta Elisabeth jovem, a atriz teve pouco destaque em recentes produções de peso como em Pobres Criaturas e agora em Tipos de Gentileza, mas mostrou que tem talento de sobra para ser muito mais do que uma mera coadjuvante. Dennis Quaid interpreta Harvey, o chefe da TV em que Elisabeth trabalha, e entrega uma boa atuação, sendo muito caricato.
Nosso veredito
Estamos diante do melhor filme de 2024 até agora, eu não sou fã de terror, muito menos de gore, terror psicológico me fascina, mas é uma pena que não temos tantos de qualidade para apreciar. A experiência de assistir “A Substância” no cinema é única, impossível ficar parado na cadeira ou tirar os olhos da tela (a não ser nas cenas de agulha), ao final do filme você pode querer aplaudir involuntariamente (acho isso ridículo, mas nesse caso me deu vontade) ou pode ter uma crise existencial, se você for mulher principalmente, ou os dois. Minha dica é: apenas vá ver esse filme no cinema! Estou esperando ansiosamente por ele no Oscar 2025.
Comments