Ritas: a trajetória de uma das maiores artistas do Brasil
- Marcos Silva
- há 1 dia
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Atualizado: há 9 minutos
Assistimos com exclusividade o vibrante documentário Ritas, que estreia nos cinemas no dia 22 de maio, data escolhida pela própria cantora como seu “novo aniversário”. Rita continuava sendo de Capricórnio, porque fazia questão, mas decidiu reinventar até isso. As palavras a seguir são simples - é impossível resumir Rita em um texto - mas, aqui estão nossas impressões sobre o documentário.

Sobre Ritas
Com um acervo de décadas, o documentário Ritas nos leva de volta ao início da trajetória de Rita Lee, acompanhando sua evolução até chegar ao merecido título de rainha do rock. A narrativa revisita o processo criativo por trás de vários de seus hits e os tornou atemporais.
Além de imagens inéditas da cantora no seu momento mais íntimo com a família, sua conexão com a natureza e seu apreço em defender a causa animal, Ritas traz também depoimentos inéditos e aspectos da vida da musa jamais mostrados antes. É um recorte perfeito e atual de um dos maiores ícones da música brasileira, força feminina que moldou (e ainda molda) o rock nacional.
Cabelos de fogo e alma livre
Ritas apresenta um panorama direto e potente da trajetória de uma artista que nunca buscou o sucesso, mas o redefiniu ao fazer da liberdade seu maior palco. A narrativa, conduzida pela própria Rita, costura momentos marcantes de sua vida e carreira, reforçando o que já era sabido por muitos: ela foi, e ainda é, uma força subversiva simplesmente por ser quem é.
Um acerto está na sua estrutura: enquanto revisitamos os momentos mais marcantes da sua trajetória, acompanhamos em paralelo imagens inéditas dos seus últimos anos de vida. Além da riqueza do conteúdo, alguns inserts artísticos - que misturam colagens, efeitos visuais e texturas - criam uma estética surrealista que ajuda a tornar o documentário mais dinâmico e ao mesmo tempo sensorial, nos aproximando da mente criativa da artista.

Entre as confissões mais íntimas, se destaca o amor incondicional por Roberto de Carvalho. Uma parceria que ultrapassa o amor romântico e vira espelho de liberdade, companheirismo e respeito. Ao lado dele, Rita construiu não só uma carreira, mas também um lar e uma vida fora dos palcos, sempre com humor e irreverência.
Rita Lee não faz sucesso
Em um dos momentos marcantes do doc, Rita está cercada de engravatados em uma reunião na sua antiga gravadora. Todos ali dão um palpite de como ela deveria se podar mais. A cantora se levanta e vai embora, mas não antes de… mandar todos ali irem tomar naquele lugar. Ela encontra então a Som Livre, e ao contrário do que afirmaram, ela mostra que sim, Rita Lee faz sucesso, só que do jeito dela.

A narrativa passa pelos Mutantes, atravessa a Refestança e chega nos anos de carreira solo, marcada por hits que continuam a atravessar gerações. Mas Ritas não se limita a uma retrospectiva musical — ele também se mistura com a história de um Brasil em retrocesso. Um país em plena ditadura, que a prendeu mesmo grávida. Uma cultura machista, que ela enfrentou ao cantar sobre sexo sem nunca se deixar sexualizar. Uma sociedade que a quis calar, mas que não conseguiu impedir seu grito.
Rita fala de drogas, de fama, da relação com a família e com o público, sempre com uma sinceridade desconcertante. O documentário não esconde suas quedas, mas também não as dramatiza. Mostra o ser humano por trás da lenda: deslumbrante, inesperada, honesta. Uma artista que se criou e se recriou diversas vezes, e que viveu como se cada fase fosse uma vida inteira dentro da mesma existência.
Com a lua na cabeça
Em paralelo com a carreira em ascensão, vemos uma parte mais íntima da cantora nos seus anos mais velhos. Em registros inéditos feitos no sítio onde morava com Roberto, ela aparece em paz, longe dos holofotes, em plena conexão com a natureza — rodeada por bichos, santos, árvores e memórias.

A energia que ela transmite é tão viva que por vezes esquecemos que este é um documentário póstumo. Rita está mais feliz do que nunca. Brincava com a câmera, contava histórias, cultivava o jardim e a espiritualidade. Devota de Nossa Senhora Aparecida, cercada por imagens religiosas, quadros e referências ao Bowie, ela criou um espaço onde podia continuar sendo ela mesma — em silêncio, mas jamais ausente.
Deus me poupe do seu fim
A certa altura, fica difícil acreditar que ela nos deixou. É como se ainda estivesse por aqui, observando tudo com aquele olhar esperto e aquele sorriso irônico. Ritas mostra uma artista que, ao envelhecer, não perdeu vitalidade, mas ganhou algo ainda mais raro: leveza. Ela parecia pronta para partir, não porque queria ir, mas porque sabia que viveu tudo o que precisava viver. E viveu mais de uma vez.
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